A Bioimpressão 3D de glândulas mamárias feitas em laboratório, tem o potencial de revolucionar a indústria agrícola, fornecendo uma alternativa mais sustentável e ética à pecuária leiteira tradicional.
A pecuária leiteira tradicional tem sido associada a diversos desafios ambientais, sociais e econômicos, tanto no Brasil quanto no mundo, tais como:
Impacto ambiental: A pecuária leiteira tradicional contribui para as emissões de gases de efeito estufa, poluição da água e desmatamento. As emissões de metano do gado representam uma parcela significativa das emissões globais de gases de efeito estufa, e o uso de fertilizantes e pesticidas na produção de ração pode levar à poluição da água e à degradação do solo.
Bem-estar animal: As práticas tradicionais da pecuária leiteira podem envolver o uso de hormônios e antibióticos, bem como confinamento e maus tratos às vacas, levando a preocupações sobre o bem-estar animal e o tratamento ético dos animais.
Custos econômicos: A pecuária leiteira tradicional pode ser cara, pois requer grandes quantidades de terra, ração e mão-de-obra. Além disso, as flutuações nos preços do leite podem torná-la um negócio arriscado para os pequenos produtores.
No Brasil, a indústria de laticínios é uma parte importante do setor agropecuário, mas enfrenta diversos desafios, como a baixa produtividade, os altos custos de produção e a necessidade de melhorias na saúde e genética animal.
Visando superar esses desafios da pecuária leiteira, outras abordagens, como a produção de leites a base de plantas (leite de soja, amêndoa, aveia) tem se tornado cada vez mais popular/consumido. E por que não irmos mais além e produzir uma solução completamente nova, tecnológica e disruptiva para um problema que é de escala global?
Você já ouviu falar sobre as glândulas mamárias feitas em laboratório?
O conceito de glândulas mamárias bioimpressas surge diante desses desafios e se baseia em (1) isolar as células do animal doador e levá-las para o laboratório para multiplicá-las, (2) desenvolver a biotinta (composta pelas células e hidrogéis), (3) o processo de Bioimpressão (onde se utiliza a biotinta + bioimpressora para gerar um construído), (4) maturação (após bioimpresso o construído é levado ao biorreator), (5) teste de funcionalidade, onde observa-se se o construído é capaz de exercer as funções adequadas, como produzir o leite.
Uma das principais vantagens das glândulas mamárias feitas em laboratório é que elas podem ser produzidas sem a necessidade de criação de animais. Isso pode levar a uma redução nas emissões de gases de efeito estufa e a uma fonte de leite mais sustentável. Além disso, essas glândulas podem produzir leite livre de hormônios e antibióticos, o que pode ser benéfico para a saúde humana e também uma alternativa/possibilidade para a hipogalactia (condição na qual as mães não conseguem produzir leite materno adequadamente).
Outra vantagem potencial delas é que podem fornecer uma fonte consistente e controlada de leite. A pecuária leiteira tradicional está sujeita a fatores ambientais e biológicos que podem afetar a qualidade e a quantidade do leite produzido. As glândulas mamárias feitas em laboratório, por outro lado, podem ser otimizadas para "metas" específicas de produção de leite e podem ser melhor monitoradas e controladas do que a pecuária leiteira tradicional.
Embora o processo básico de Bioimpressão de glândulas mamárias seja similar a outros tipos de Bioimpressão, existem desafios únicos associados a ela; como a necessidade de criar uma estrutura 3D complexa que possa mimetizar as propriedades funcionais de uma glândula mamária real.
No entanto, avanços recentes estão tornando cada vez mais viável o desenvolvimento de glândulas mamárias feitas em laboratório para a produção de laticínios. Por exemplo, na China, em 2019, uma equipe de pesquisadores publicou um estudo na revista Biofabrication em que utilizaram a Bioimpressão 3D para criar um construído funcional da glândula mamária usando células da glândula mamária de ratos. Os pesquisadores conseguiram demonstrar que a glândula mamária bioimpressa poderia produzir leite in vitro.
Em 2020, pesquisadores da Suíça e da Holanda publicaram um estudo na revista Nature Communications no qual usaram técnicas de engenharia de tecidos para criar uma uma glândula mamária funcional usando células da glândula mamária de vacas. Os pesquisadores conseguiram demonstrar que a glândula mamária produzida por engenharia de tecidos pode produzir leite in vitro.
Em 2021, uma equipe de pesquisadores dos EUA publicou um estudo na revista Biomaterials em que utilizaram a Bioimpressão 3D para criar uma construção funcional da glândula mamária usando células da glândula mamária de camundongos. Os pesquisadores conseguiram demonstrar que a glândula mamária bioimpressa poderia produzir leite in vitro e in vivo.
Esses estudos demonstram que as glândulas mamárias feitas em laboratório têm o potencial de produzir leite. No entanto, são pesquisas em early stage e ainda é necessário dedicarmos tempo as pesquisas de base a fim de otimizar a tecnologia para produção em larga escala e garantir que o leite produzido em laboratório seja seguro para consumo humano.
Devido ao potencial desta tecnologia, muitas empresas atualmente estão trabalhando na produção de glândulas mamárias, visando a produção de lácteos. Veja alguns exemplos baixo:
New Culture: Uma startup com sede nos EUA que está desenvolvendo produtos lácteos sem origem animal, cultivados em laboratório, incluindo leite, queijo e manteiga.
TurtleTree Scientific: Uma empresa com sede em Cingapura que está desenvolvendo leite cultivado em laboratório usando células da glândula mamária.
Biomilq: Uma startup com sede nos EUA que está desenvolvendo leite materno cultivado em laboratório usando células da glândula mamária.
A Bioimpressão é uma tecnologia versátil, que pode ser utilizada para melhorar a vida das pessoas, tanto no âmbito alimentício (utilizando células como pequenas máquinas para produzir laticínios, por exemplo) como também pode ser utilizada na engenharia tecidual, buscando gerar tecidos/órgãos que se assemelhem com os reais.
Para saber mais sobre a aplicação da tecnologia de Bioimpressão 3D para a produção de próteses mamárias, leia a nossa matéria dedicada a esse tema, com o título "Bioimpressão de próteses mamárias" .
Referências
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